A noite escura da alma
Relatei em posts passados sobre um momento delicado em minha vida, quando vivi uma crise de fé aguda. Se fosse médica, era assim que diagnosticaria o que vivi nesse período. Foi um tempo difícil e ainda me pergunto se devo colocar isso no passado como algo que venci, ou que me marcou e sempre vai estar ali pra me relembrar. Como Jacó que depois de lutar com o anjo saiu daquela noite manco, é assim que me percebo, como se também mancasse após tudo isso.
Durante esse período li muitos livros, me debrucei na apologética (estudo sobre os argumentos para a existência de Deus) e encontrei tantos autores que também passaram por uma situação semelhante, a noite escura da alma, como João da Cruz escreveu, e finalmente entendi o que uma vez li, que a nossa maior luta não será contra o diabo e sim contra Deus. Em tentar entendê-lo, porque faz o que faz, diz o que diz e é o que é e não o que gostaríamos que ele fosse.
O sofrimento, as dores da vida, o mal do mundo, tanta coisa nos faz pôr em cheque nossa fé. E se você nunca pensou como Jó e questionou a Deus, ou se sentiu como Jesus na cruz, abandonado, meus parabéns, você realmente é um ser diferenciado, mas a maioria de nós em algum momento de sua vida de fé, vai passar por isso. E de tudo não é ruim, ainda que no momento pareça uma dor absurda e uma rede de dúvidas sem fim, isso também passa, ou ao menos, se torna mais maleável, a gente aprende a conviver. E vai entendo que a vida não vai acontecer após a gente resolver toda essa crise, mas viver apesar dela.
Não penso que Deus se ofenda quando duvidamos dele, acredito que Ele não fique feliz, pois quem ficaria tranquilo após ser desconfiado? Mas penso que isso não o afeta, não muda quem Ele é, acredito que ele entende que faz parte da nossa natureza, e por causa do pecado, não é uma questão tão incomum. Se assim não o fosse porque a Bíblia relataria aquele diálogo que Jesus teve com Tomé quando lhe mostrou suas chagas? E vou além, porque Jesus teria mostrado suas cicatrizes? Porque Ele teria repreendido os discípulos que caminharam com ele por terem pouca fé, e se impressionado com pessoas que demostraram tamanha confiança? Pois é, essa é uma grande questão.
A verdade é que não tenho ainda tantas respostas, não posso afirmar que compreendo Deus em sua totalidade (quem pode? "quem conheceu a mente do Senhor") que entendo porque Ele cura alguns e outros não, porque tanta coisa ruim acontece, mas a fé que duvida e tropeça é a fé que tem a chance de aprender a confiar ainda quando não pode ver ou entender, é a fé que amadureceu para além da emoção e da infantilidade, é a fé que aprendeu a confiar independe das circunstância, que ainda tropeçando, continua. Pois ter fé não significa crer no escuro, se enganar ou alienar como alguns até pensam, mas é crer contra a esperança. Diria até que é saber, e o saber é maior do que o sentir, pois ainda quando não sinto que sou amada, isso não se torna um fato, ainda quando não tenho vontade de cumprir as minhas obrigações, o saber que eu tenho que cumprir, me faz ir adiante.
Amo aquele verso que diz: Cri por isso falei. Pois ele não diz senti e por isso falei, mas cri. E se tem uma coisa que aprendi a duras penas é que não posso crer sozinha, ainda que tente crer por mim mesma, é um trabalho do Espírito Santo, pois é Ele quem nos convence da verdade, da justiça e do juízo. A Bíblia também diz que a fé é um dom, e que Jesus é o autor e consumador da nossa fé, sem Ele não temos como crer. A palavra também nos diz que a fé vem pelo ouvir a palavra de Deus.
Acho que escrevi tudo isso pra você que também passou ou está passando por um momento assim, para que não se sinta só no seu sofrimento, na sua angústia, no seu vale. Também escrevi pra te lembrar que esse momento difícil, de crise, pode realmente ser uma oportunidade.
Oportunidade de rever conceitos, de parar para pensar e ouvir mesmo, assim prestando atenção nas coisas que só repetimos como um papagaio depois de algum tempo, é ir no fundo de nós mesmos e acolher esse grito desesperado por algo maior do que nós, e aí perceber que encontramos esse Deus que Paulo disse no areópago ser o Deus desconhecido, que aquele povo estava adorando (Atos 17:15-34) e que na verdade não está longe de nós, não está se escondendo, mas que se fez conhecido em Cristo Jesus. E é em Cristo Jesus que vemos sua plenitude. E olha que lindo, o nosso Senhor também tem cicatrizes de uma noite tenebrosa, que era o prelúdio do Domingo da ressurreição.
E ao olhar para suas cicatrizes enxergo todos que sofrem, a dor do mundo e o estrago do pecado. Mas também contemplar a salvação de Deus, tanto dessa noite escura, quanto a salvação para a vida eterna.
"Não seja incrédulo mas crente" foi o que Jesus disse à Tomé (João 20:27-29) e repito à mim mesma como se Ele também dissesse a mim.
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