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Crise de fé- um relato parte 1

Por que eu existo? Qual o significado da vida? Da morte? Pra onde estou caminhando? Por que estou aqui na Irlanda do Norte? Quem sou eu? O que quero? Quais os meus sonhos? No que sou boa? O que vou fazer dos diplomas que recebi? O que estou fazendo da minha vida? Por que  creio no que creio? Como crer no que creio afeta minha vida? Como viver meus dias? Será que realmente creio no que eu digo crer? Quem é Deus? Por que Jesus fez o que fez e como isso implica na minha vida? Será que realmente tenho mesmo um chamado pra missões?

Todas essas questões tem bombardeado minha mente desde a páscoa. Questionar tudo o que estava tão apático, certo e sem nenhum abalo tem mexido comigo de uma forma que nem sei como colocar em palavras, e olha que as amo, admiro e me sinto muito amiga delas. Mas estou vivendo um daqueles momentos em que não consigo exatamente expressar o que sinto e como sinto. Tem sido difícil. Já chorei. Já fugi. Agora estou tentando encarar todas essas dúvidas entendendo que só conseguimos resolver  crises encarando-as, nem tanto essa coisa de 'abraçar seu caos' mas mais como um se deparar e encarar quaisquer que sejam as dúvidas, os medos e as incertezas. Isso é difícil pra caramba. Nunca senti tanto medo em toda minha vida, e o pior é essa sensação de me sentir tão perdida. Comecei a sentir que preciso parar tudo que estou fazendo pra resolver o que quer que seja tudo isso mas ao mesmo tempo, sinto que não é bem assim que a banda toca. No fundo eu sei que todas essas dúvidas não ofendem a Deus. Porque ele teria medo delas se nada pode mudar quem ele é? A questão toda é o que está dentro de mim. E organizar tudo isso tem me custado muita energia, e nem diria que sou eu quem estou a organizar tudo isso, diria que é muito mais um trabalho em conjunto.

Sei que quando estamos vivendo coisas assim sentimos tanta pressa em resolver logo, em seguir em frente, em entender ou pelo menos saber quanto tempo tudo isso vai durar pra que eu possa me organizar aqui. As responsabilidades existem, os planejamentos, a rotina, está tudo aí porque a vida não para. Ela não espera estarmos com tudo certo e resolvido, o sol brilha no céu um dia depois do outro, quer estejamos contentes ou vivendo o pior dia de nossas vidas.

Gosto muito de ouvir as pessoas compartilhando sobre um tempo muito difícil na vida delas, quando elas dizem "aqueles foram os piores anos da minha vida, foi o pior momento/dia/ano/semana/mês " porque se elas estão compartilhando sobre é porque há esperança, é porque houve esperança. E saber disso me anima no meu processo porque é tão fácil pensar que só a gente está passando por algo ruim e difícil, só a gente tem dias ruins. E ouvir testemunhos assim me traz animo em saber que um dia eu vou poder compartilhar sobre esse tempo difícil também, e poder fazer isso é prova de que o que quer que tenha sido difícil e complicado, foi vencido. Saber disso me traz uma enorme esperança.

Mas também tem os dias de pressa, de medo. De me sentir tão sozinha na vida, de pensar que não faço ideia do que estou fazendo com a minha vida, de me sentir tão perdida. Outro dia alguém me disse que está tudo bem se sentir perdida ás vezes, isso significa que precisamos ser encontrados, mas é tão ruim estar perdida, é como ir pra um lugar que você não sabe o caminho, você pode encontrar pessoas que te deem informações ou pode ir por um caminho que quase não tem ninguém e as placas de direções são bem confusas. Acho que essa seria a ilustração perfeita pro meu presente momento. E ainda que nesse caminho tenham algumas pessoas, eu sei que no fundo nenhuma delas podem me ajudar de verdade. Quando a crise é dentro de nós, tão dentro de nós que nem nós mesmos temos acesso á esse lugar sabe? Sei que as perguntas que tenho feito são profundas e que levam tempo a serem respondidas, só não sei se estou disposta a esperar tudo isso, por isso que sinto essa vontade de parar de caminhar. Me sinto triste e frustrada por estar nesse lugar tão desconhecido. Por ter sido alguém que viveu uma vida tão pacata tanto tempo e agora que sinto que meus horizontes foram ampliados eu entrei em parafuso. Não confio em mim. Não sei como me posicionar. O que pensar. O que fazer. Tenho me deparado com uma pessoa que nem sabia que eu era. Como se eu tivesse o tempo e recursos para m enxergar de verdade. Me enxergar sendo desafiada, pressionada, questionada, me enxergar tendo possibilidades que um dia foram sonhos tão distantes, perceber que no fundo eu nem sou tão boa e organizada como achava, que eu sou muito tentada e que a vida é bem mais difícil do que eu esperava. Que não ter resposta ás vezes me deixa com a sensação de afogamento. E que eu não sei como seguir. 

Preciso me lembrar que essa crise toda não me define, mas é difícil pensar assim quando tudo o que sou, penso, a forma como vivo tem sido questionada, provada no fogo. Sinto medo mas também estou cansada desse padrão, estou cansada de não saber até quando tudo isso vai durar. De um dia ter certeza de tudo e no outro não ter certeza de nada e entre esses dias ainda tem aquela certeza mas que não é o suficiente pra fazer tudo o que acredito que preciso, ou na quantidade que eu penso que seja necessária pra ser uma missionária. Me sinto triste também quando olho para as pessoas ao meu redor e as vejo tão seguras, vivendo seus melhores momentos, tão conscientes de tudo e eu aqui sem saber o que fazer. Sem saber como viver. E o pior é saber que ninguém pode me ajudar, no sentido geral da coisa, não, no âmago da questão, porque não são os livros mais inteligentes que poderia ler, os teólogos mais bem eloquentes que poderia ouvir ou o que quer seja, porque nada disso cala as perguntas que tenho feito, ou melhor, nada disso as responde. 

Não sei o que esperar dos próximos dias, semanas, meses. Não consigo ver a luz no fim desse túnel. Estou cansada. Seca. Sem energia. Pensando como pude viver dias tão gloriosos na minha caminhada de fé, pregando, servindo, chorando pelas pessoas, orando e agora estou aqui nesse buraco existencial com milhões de perguntas, nenhuma resposta e nenhuma saída.  Será que eu vou ficar pra sempre nesse lugar? Se esse é um ponto de virada de chave, porque isso não está acontecendo? 


Texto escrito dia 22 de Novembro de 2022

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